Contratualização estratégica: garantindo segurança jurídica e eficiência na cobrança de honorários.
- Lídia Alves
- 30 de jun.
- 4 min de leitura

O contrato é o instrumento fundamental das relações negociais. Como bem colocou Caio Mário da Silva Pereira, "o mundo moderno é o mundo do contrato."
Seja você advogado, médico, engenheiro, arquiteto ou qualquer outro profissional autônomo, a falta de um contrato bem estruturado ou cláusulas mal redigidas podem transformar a busca pelo pagamento justo em um verdadeiro pesadelo judicial. Este pesadelo afeta milhares de profissionais diariamente e tem suas raízes em falhas contratuais que poderiam ser facilmente evitadas com o conhecimento adequado.
A questão transcende aspectos meramente técnicos e toca princípios filosóficos fundamentais sobre a dignidade do trabalho, a ética nas relações profissionais e a importância do cumprimento das obrigações assumidas.
Como observava o filósofo romano Sêneca, "a vida é como uma lenda: não importa se for longa, mas se for bem contada". Para os profissionais liberais, esta máxima pode ser adaptada: não importa apenas a qualidade do serviço prestado, mas como este foi adequadamente documentado e protegido juridicamente.
Por um lado, tem aqueles profissionais que não fazem o contrato escrito. O contrato verbal é válido e não impede o pagamento de honorários se o serviço foi prestado, conforme jurisprudência farta sobre o tema, mas criar essa comprovação sem documentação adequada torna o processo muito mais complexo e custoso.
Por outro lado, tem aqueles que fazem o contrato escrito, porém, a ausência de previsões ou inadequação do instrumento contratual não protege o profissional.
Essas situações, infelizmente comuns, revelam um problema estrutural: a ausência de instrumentos contratuais adequados que protejam o profissional liberal.
Profissionais liberais e empresários de pequenas empresas enfrentam rotineiramente o risco de litígios e inadimplência quando atuam sem um contrato elaborado por especialista. Na ausência de cláusulas claras, surge a insegurança jurídica: obrigações mal definidas geram disputas sobre escopo de serviços, prazos e valores. Essa falta de transparência expõe esse profissional a:
Demandas judiciais onerosas, pois o juiz pode entender obrigação dúbia como mera aplicação da lei geral, sem a especificidade do acordo.
Responsabilidade civil ampliada, caso o cliente alegue falha na prestação de serviço por ausência de critérios objetivos de entrega.
Perda de receitas e aumento de custos operacionais quando não há amparo para cobrança direta dos valores devidos.
Principais erros contratuais que geram problemas na cobrança da remuneração ou honorários.
1. Falta de especificação clara dos serviços que serão prestados: esse é um dos erros mais graves e frequentes. Muitos profissionais utilizam descrições genéricas como "prestação de serviços advocatícios" ou "consultoria jurídica" sem detalhar exatamente o que está incluído nos serviços. Essa falta de previsão, obriga o profissional a prestar todo e qualquer serviço compatível com suas forças e condições, claro que dentro do escopo contratado (art. 601, Código Civil).
2. Falta de previsão de cláusulas de inadimplência: muitos contratos não preveem as consequências da inadimplência, como incidência de multa, juros de mora e correção monetária com o índice de correção. Esta omissão dificulta significativamente a cobrança judicial, pois o profissional não tem respaldo contratual para exigir valores acessórios, salvo aqueles que decorrem da Lei.
3. Falta de definição clara dos valores e forma de pagamento: contratos que não especificam com precisão os valores dos honorários, datas de pagamento, parcelas e critérios de reajuste criam margem para interpretações divergentes. É comum em contratos de profissionais liberais, como arquitetos e engenheiros que os serviços sejam realizados por etapas. Mas, os contratos não são adequados para que, em caso de rescisão, sejam calculados os honorários conforme as etapas elaboradas.
4. Ausência de previsões sobre rescisão contratual: é outro erro crítico. Sem cláusulas que regulamentem o término antecipado do contrato, tanto o profissional quanto o cliente ficam desprotegidos.
Impacto da má elaboração contratual na prática profissional
1. Demora excessiva na cobrança: para que um contrato seja executado judicialmente, ele deve conter obrigação certa, líquida e exigível. Contratos com cláusulas ambíguas ou contraditórias não atendem a esses requisitos, forçando o profissional a buscar primeiro uma ação de conhecimento para esclarecer as obrigações, o que demora bem mais que uma execução judicial (procedimento mais célere).
2. Custos processuais elevados: a deficiência contratual não apenas dificulta a cobrança, mas também aumenta significativamente os custos para recuperar os valores. Uma execução direta de contrato bem elaborado pode ser resolvida em poucos meses, enquanto uma ação de cobrança baseada em contrato deficiente pode arrastar-se por anos, consumindo recursos que poderiam ser investidos na atividade profissional.
3. Desgaste na relação profissional: contratos mal elaborados frequentemente geram conflitos que poderiam ser evitados. O desgaste na relação com o cliente prejudica não apenas o caso específico, mas também a reputação profissional e a possibilidade de indicações futuras.
4. Insegurança: a ausência de contratos adequados cria um ciclo de insegurança. O profissional trabalha sem garantias claras de pagamento, enquanto o cliente não tem certeza exata de suas obrigações. A insegurança prejudica ambas as partes e contribui para a precarização das relações profissionais.
A importância da assessoria jurídica preventiva
Muitos profissionais liberais só procuram orientação jurídica quando já estão enfrentando problemas de cobrança. A abordagem reativa é muito mais custosa que o investimento preventivo em contratos bem elaborados.
A contratação de um advogado para elaborar ou revisar contratos de prestação de serviços representa um investimento que se paga rapidamente pela segurança jurídica proporcionada e pela redução de conflitos futuros.
Um contrato bem elaborado não é apenas um documento jurídico, mas uma ferramenta estratégica de gestão profissional. Ele protege tanto o prestador quanto o tomador de serviços, estabelece expectativas claras e proporciona segurança jurídica para ambas as partes.
Inspirando-nos na máxima aristotélica sobre justiça distributiva e nos ensinamentos kantianos sobre autonomia da vontade, devemos compreender que contratos bem estruturados não apenas protegem o profissional, mas contribuem para relações mais equilibradas e justas em toda a sociedade.
A expertise profissional desenvolvida ao longo de anos de estudo e prática merece ser protegida por instrumentos jurídicos igualmente competentes.
Investir na elaboração de contratos é estratégia essencial para minimizar riscos de responsabilidade civil, agilizar cobranças e reduzir a inadimplência. Atraia e retenha clientes com segurança jurídica, consolidando sua reputação como profissional liberal ou empresário preparado para o mercado contemporâneo.
Por Lídia Alves
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