top of page

Contrato de prestação de serviços: riscos envolvidos e cuidados necessários.

  • Foto do escritor: Lídia Alves
    Lídia Alves
  • 6 de mai.
  • 7 min de leitura

ree

No dinâmico mundo dos negócios, a formalização das relações comerciais é imprescindível para garantir segurança jurídica, evitar conflitos e otimizar operações.


O contrato de prestação de serviços, instrumento amplamente utilizado por empresas para contratar atividades especializadas – de uma consultoria em marketing a uma assessoria jurídica – possui nuances que vão além do simples acordo comercial.


Com a recente atualização do entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF), torna-se ainda mais necessário compreender as especificidades e os cuidados que se deve ter para não incorrer em riscos, especialmente nos temas de "pejotização" e terceirização.


1. Conceituação e importância


O contrato de prestação de serviços é um acordo pelo qual uma das partes, o prestador, se compromete a executar um serviço ou projeto específico para a outra parte, o contratante, mediante remuneração. Diferentemente do contrato de trabalho, que se rege pela Consolidação das Leis do Trabalho ( CLT), esse acordo é de natureza civil/comercial, conferindo maior autonomia ao profissional contratado.


Embora possam parecer semelhantes, os contratos de prestação de serviços diferem substancialmente dos contratos de trabalho. Os elementos caracterizadores do vínculo empregatício – pessoalidade, habitualidade, subordinação e onerosidade – não devem estar presentes no pacto firmado entre empresas e prestadores.


Respeitar o prestador não significa dar ele liberdade de fazer o que quiser. No contrato de prestação de serviços deve ser definidos os parâmetros do serviço a ser realizado. Por meio da SLA (Service Level Agreement) - Acordo de Nível de Serviço - é possível estabelecer a qualidade, prazos e critérios de desempenho do serviço.


2. Riscos envolvidos e cuidados necessários


Apesar de sua utilidade, o contrato de prestação de serviços envolve riscos que podem transformar a relação contratual em fontes de litígio:


Mascaramento de relações de emprego: um dos maiores riscos é o uso inadequado do contrato para disfarçar uma verdadeira relação de emprego – prática conhecida como “pejotização”. Essa conversão consiste em transferir o vínculo empregatício para um formato civil, em que o prestador atua como pessoa jurídica.


Se, por exemplo, uma empresa impõe horários fixos, controle rigoroso das atividades e condições similares às de um empregado, mesmo que o contrato seja celebrado com uma PJ, há o perigo de caracterização indireta do vínculo empregatício. Essa requalificação pode levar à obrigação de pagar retroativamente direitos trabalhistas, como férias, 13º salário e FGTS.


Falta de clareza no escopo dos serviços: contratos pouco detalhados podem gerar conflitos, como divergências quanto ao que exatamente foi contratado, prazos de entrega ou formas de remuneração. Em vez de utilizar termos vagos, o ideal é especificar as atividades que serão desenvolvidas para garantir transparência e segurança para ambas as partes.


Ausência de definição das condições comerciais: além dos serviços, é fundamental delinear pontos como forma e prazos de pagamento, reembolso de despesas, propriedade intelectual dos materiais produzidos e condições para eventual rescisão contratual. Essa clareza evita dúvidas futuras e protege o contratante contra interpretações desfavoráveis em demandas judiciais.


4. Pejotização e Terceirização: conceitos e implicações


A “pejotização” ocorre quando, para reduzir encargos trabalhistas e custos com benefícios, as empresas convertem uma relação de emprego—com todos os direitos garantidos pela CLT—numa relação contratual com uma pessoa jurídica. Essa prática, além de onerar o trabalhador, pode trazer riscos jurídicos e reflexos em demandas judiciais se a verdadeira natureza da relação for reconhecida em juízo.


Arnaldo Rizzardo Filho, aborda em seu livro "Curso de redes contratuais" a relação entre as plataformas digitais, a economia em rede e as novas formas de trabalho, como o autoempreendedorismo e a pejotização, no contexto do Direito do Trabalho. O autor analisa decisões judiciais brasileiras e francesas sobre o reconhecimento ou não do vínculo de emprego em casos envolvendo plataformas como a Uber, Rappi, Loggi e Airbnb, evidenciando diferentes interpretações sobre a subordinação e a autonomia dos trabalhadores.


Já a terceirização é uma modalidade onde uma empresa (tomadora de serviços) contrata outra (prestadora) para realizar atividades específicas, que podem ser tanto atividades-meio quanto atividades-fim.


O STF reafirmou a licitude dessa prática, inclusive para atividades-fim, desde que sejam respeitados os princípios de autonomia – afastando os elementos típicos do vínculo empregatício.


Por exemplo, uma empresa de tecnologia pode terceirizar sua equipe de suporte técnico para uma empresa especializada, contanto que essa relação seja pautada pela autonomia do prestador e pela ausência de subordinação direta. Contudo, a tomadora deve verificar a idoneidade da prestadora e estar ciente de suas responsabilidades subsidiárias em caso de eventuais passivos trabalhistas.


5. O entendimento do STF e seus impactos


Em julgamentos recentes – como na ADPF 324 e Tema 725 – a Corte destacou que o cerne da controvérsia está na manutenção da autonomia do prestador de serviços. Ao afastar elementos característicos da relação de emprego (subordinação, habitualidade, onerosidade e pessoalidade), o STF reafirmou a legitimidade do contrato de prestação de serviços, independentemente do objeto social da contratação.


Além disso, o recente Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1532603 (Tema 1389), cuja repercussão geral foi reconhecida, traz à tona questões importantes como a competência para julgar casos de alegada fraude nesses contratos e a definição do ônus da prova. Essa decisão, que discute a contratação civil de trabalhadores autônomos ou de pessoas jurídicas, sinaliza uma tendência de pacificação da matéria e orienta os empresários a adotarem contratos claros e objetivos, reforçando a necessidade de que a autonomia do prestador seja preservada para afastar a caracterização de vínculo empregatício.


Alguns impactos do entendimento do STF nas relações de trabalho:


Autonomia é essencial: Para que a contratação via PJ seja considerada válida, o prestador deve ter liberdade real para definir sua rotina, métodos de trabalho e horários. Se ele for submetido a um controle exagerado, como se fosse um empregado (subordinação, pessoalidade, habitualidade e onerosidade típicas da CLT), corre o risco de que, judicialmente, esse contrato seja reclassificado como vínculo empregatício.


A validade do contrato depende da prática e não apenas da forma: O STF entende que se o contrato de prestação de serviços evidenciar a autonomia do prestador, mesmo que celebrado como pessoa jurídica, ele é legítimo. Por outro lado, se os elementos de subordinação e controle característicos de uma relação de emprego estiverem presentes, a mera formalização via PJ pode ser considerada uma fraude.


Uniformização e clareza contratual: Essa interpretação reforça a importância de se redigir contratos bem detalhados, onde estejam explicitadas as condições de execução dos serviços, sem imposição de regras que descaracterizem a autonomia do prestador.


6. A redação e gestão do contrato de prestação de serviços


Um contrato bem elaborado deve definir com exatidão os direitos, as obrigações e os limites de cada parte envolvida. Isso significa que o contrato deve ter:


  • Clareza e objetividade: a utilização de uma linguagem simples e direta elimina termos vagos e permite que todos os envolvidos compreendam exatamente o que foi acordado.


  • Definição das responsabilidades: quanto mais detalhadas forem as cláusulas, menor a possibilidade de interpretações dúbias. A inclusão de especificações, como a forma de entrega dos serviços, métodos de avaliação e eventuais penalidades em caso de descumprimento, fortalece a segurança jurídica.


  • Prevenção de disputas: documentar de forma completa e organizada o acordo entre as partes protege tanto o contratante quanto o prestador, criando um registro sólido de suas intenções e obrigações. Essa prática diminui a probabilidade de conflitos que possam levar à necessidade de intervenção judicial.


  • Acompanhamento contínuo: as partes devem monitorar regularmente o andamento das obrigações contratuais. Isso pode ser feito por meio de reuniões periódicas, elaboração de relatórios e registros formais das atividades e entregáveis previstos no contrato.


  • Comunicação proativa: estabelecer canais de comunicação eficientes e manter um registro de todas as interações ajuda na resolução de dúvidas ou na identificação rápida de possíveis problemas. Essa postura colaborativa permite ajustes e readequações antes que se agravem.


  • Formalização de alterações: caso ocorram alterações no escopo ou nas condições do contrato, é essencial formalizar essas mudanças por meio de aditivos contratuais assinados por ambas as partes. Essa prática garante que todas as modificações sejam registradas oficialmente e que não haja interpretações equivocadas sobre os novos termos.


  • Investir em consultoria jurídica especializada: uma assessoria profissional pode orientar sobre a melhor forma de estruturar o contrato e identificar eventuais pontos de risco que possam prejudicar a relação, adequando o documento ao entendimento dos tribunais, como os posicionamentos recentes do STF.


  • Cumprir as obrigações com diligência: O comprometimento com o cumprimento dos termos acordados reforça a confiança mútua. Quando ambas as partes demonstram comprometimento, a probabilidade de conflitos diminui substancialmente.


Conclusão

Em suma, o uso inadequado da "pejotização" pode transformar um arranjo que aparenta flexibilidade em uma armadilha jurídica e financeira, comprometendo a reputação e a saúde econômica da empresa. Por esse motivo, é essencial que os contratos sejam cuidadosamente elaborados, evidenciando a autonomia do prestador e evitando práticas que possam ser interpretadas como tentativa de burlar a legislação trabalhista.


Uma boa redação contratual e uma gestão ativa após a assinatura são fundamentais para evitar interpretações divergentes e, consequentemente, a judicialização das relações comerciais. Quando o contrato é redigido com clareza, precisão e de forma personalizada às necessidades das partes, reduz-se o risco de ambiguidades que possam dar margem a questionamentos ou litígios futuros.


Referências bibliográficas:

Tema 725 - Terceirização de serviços para a consecução da atividade-fim da empresa. Supremo Tribunal Federal. Disponível em: Supremo Tribunal Federal>. Acesso em: 06/05/2025


Tema 1389 - Competência e ônus da prova nos processos que discutem a existência de fraude no contrato civil/comercial de prestação de serviços; e a licitude da contratação de pessoa jurídica ou trabalhador autônomo para essa finalidade. Disponível em: Supremo Tribunal Federal>. Acesso em: 06/05/2025


ADPF 324 - Terceirização de atividade-fim e de atividade-meio. Constitucionalidade. Disponível em: paginador.jsp>. Acesso em: 06/05/2025


Rizzardo Filho, Arnaldo. Curso de redes contratuais. Porto Alegre. Livraria do Advogado, 2022.


CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Compete à Justiça comum, e não à Justiça do Trabalho, julgar demanda ajuizada por motorista de aplicativo em face da empresa gestora de plataforma digital, tendo em vista a relação de natureza civil existente entre as partes. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: < https://buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/e6e8bbe351bf19f963820a96543f25db>. Acesso em: 06/05/2025



 
 
 
bottom of page